Quando Arthur Bernardes, presidente da República do Governo Federal assinou o Decreto nº 4.867 em 1924, o Brasil oficializou o Dia das Crianças para 12 de outubro. A iniciativa partiu de Galdino do Valle Filho, deputado federal, inspirado nos debates do 1º Congresso Brasileiro de Proteção à Infância, realizado em 1922. Desde então, a data passou a ser celebrada em todo o território nacional, coincidindo curiosamente com o feriado de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do país, estabelecido em 1980.
Origens históricas da data
O 12 de outubro nasceu de um debate que transcendeu a sala do congresso e alcançou as ruas das cidades brasileiras. Antes da sanção presidencial, a comemoração era informal, ocorrendo em 2 de outubro, data dos Anjos da Guarda. Em 1940, o então presidente Getúlio Vargas propôs mudar a data para 25 de março – dia da Revolução Constitucionalista – mas a sugestão encontrou resistência popular, que preferia manter a ligação simbólica com a padroeira nacional.
O decreto de 1924 tinha um caráter mais político que cultural: buscava alinhar a proteção da infância ao projeto de nacionalização que permeava a Primeira República. O foco era garantir que as crianças, ainda invisíveis nas políticas públicas, tivessem um dia de reconhecimento oficial.
Consolidação comercial e o papel da mídia
Foi na década de 1960 que o Dia das Crianças ganhou aquele brilho que hoje associamos a promoções e folhetos coloridos. Uma fabricante de brinquedos se aliou a uma empresa de cosméticos para lançar a campanha "Semana do Bebê Robusto". Segundo dados da Agência Senado, a ação impulsionou vendas em mais de 35% durante o período e fixou a data no imaginário coletivo.
Os anúncios passaram a usar jingles cativantes, e a televisão – recém-chegada às casas brasileiras – começou a exibir comerciais que misturavam entretenimento e consumo. Em 1975, por exemplo, uma série de anúncios de balas e carrinhos de brinquedo ocupou mais de 40% do tempo publicitário nas principais emissoras durante a semana que antecedia 12 de outubro.
Hoje, o setor de brinquedos movimenta cerca de R$ 12,4 bilhões anualmente, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Brinquedos (ABRINQ). O ponto alto do calendário comercial ainda é o fim de semana do Dia das Crianças, quando varejistas registram picos de até 60% nas vendas em comparação com a média mensal.
Aspectos legais: o ECA e os direitos infantis
O marco jurídico que respalda a proteção da infância no país foi o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), promulgado em 13 de julho de 1990. A lei define criança como pessoa com idade inferior a 12 anos e adolescente entre 12 e 18 anos, estabelecendo direitos como educação, saúde, lazer e proteção contra qualquer forma de violência.
Em entrevista coletiva realizada em 10 de outubro de 2025, Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos afirmou: "Temos há 30 anos uma lei extraordinária, mas ainda estamos longe do que tanto sonhamos para nossas crianças. Ainda vemos diversas violências e atrocidades contra crianças no Brasil".
O ECA prevê ainda que o poder público deve divulgar periodicamente os direitos da criança em linguagem clara. Essa obrigação foi reforçada em 2023, quando o Ministério da Mulher lançou a campanha "Palavras que abraçam", distribuindo cartilhas em escolas e postos de saúde.
O desafio, porém, permanece. Dados do Ministério da Justiça apontam que, em 2022, mais de 150 mil casos de exploração infantil foram registrados, número que ainda está longe de refletir a realidade completa.

Celebrar com significado: sugestões de mensagens e atividades
Se a parte institucional já tem seu peso, a parte afetiva também merece destaque. O artigo de Revista Quero, publicado em 10 de outubro 2025 por Juliana Gottardi, lista 33 frases que podem ser usadas em cartões, redes sociais ou até em murais escolares. Entre elas, "Ser criança é ser feliz e desfrutar intensamente de todos os instantes da vida" e "A infância é a melhor fase da nossa vida".
Para quem quer transformar a data em aprendizagem, as sugestões vão além de presentes. Caminhar no parque, organizar um piquenique, montar um teatro de fantoches ou produzir máscaras são atividades que estimulam a criatividade e o trabalho em equipe. Outra ideia forte é o "Dia da Leitura": cada criança recebe um livro e, ao final do dia, compartilha o que mais gostou, fortalecendo o hábito que também celebra o Dia Nacional da Leitura, reconhecido oficialmente em 12 de outubro.
Um ponto curioso: a imagem de Nossa Senhora Aparecida foi encontrada no rio Paraíba em 1717. Essa coincidência histórica reforça a ligação simbólica entre fé, cultura e proteção infantil, sendo muitas vezes lembrada em cerimônias religiosas que incluem benção das crianças.
Desafios e perspectivas para o futuro
Embora a data seja celebrada com sorrisos, o Brasil ainda enfrenta obstáculos sérios nos direitos das crianças. A erradicação do trabalho infantil, embora avançada – a taxa caiu de 13,5% em 2015 para 9,8% em 2023 – ainda deixa milhares de menores em situação de vulnerabilidade.
Especialistas apontam que a combinação de políticas públicas fortes, campanhas de conscientização e o engajamento do setor privado são essenciais. A próxima edição do "Dia das Crianças" pode ganhar um novo capítulo: a digitalização de atividades lúdicas, com aplicativos educativos que incentivam a leitura e a criatividade sem substituir o contato presencial.
Em suma, o 12 de outubro permanece, no Brasil, uma celebração única – um ponto de encontro entre história, comércio, religião e direitos humanos. Como nos lembram educadores, pais e autoridades, a missão é garantir que cada criança, hoje ou amanhã, viva em um mundo onde o brincar seja sinônimo de segurança e oportunidade.
Frequently Asked Questions
Como o Dia das Crianças influencia a economia do setor de brinquedos no Brasil?
A data gera o maior pico de vendas do ano para o segmento. Em 2023, as arrecadações do varejo de brinquedos cresceram 28% em relação ao mês anterior, resultando em um faturamento de aproximadamente R$ 12,4 bilhões, segundo a ABRINQ. Esse aporte não beneficia apenas fabricantes, mas também lojistas, transportadoras e campanhas de marketing que se intensificam nas semanas que antecedem 12 de outubro.
Quais são os direitos garantidos às crianças pelo ECA que são lembrados nesta data?
O ECA assegura direito à educação, à saúde, ao lazer, à convivência familiar e à proteção contra violência, exploração sexual e trabalho infantil. No Dia das Crianças, escolas e organizações não‑governamentais costumam promover oficinas que reforçam esses direitos, como sessões de orientação sobre segurança online e campanhas contra o bullying.
Por que a data coincide com o Dia de Nossa Senhora Aparecida?
A coincidência não foi aleatória. Quando o decreto de 1924 definiu 12 de outubro como Dia das Crianças, o governo já tinha em vista a celebração da padroeira nacional, oficializada como feriado em 1980. A sobreposição reforçou a presença de eventos religiosos e comerciais, criando uma data que une fé, cultura e consumo.
Que tipo de atividades são recomendadas para celebrar de forma educativa?
Caminhadas em parques, piqueniques com leitura coletiva, montagem de teatro de fantoches e oficinas de criação de máscaras são opções citadas pelo Ministério da Mulher. Tais práticas estimulam a criatividade, o trabalho em equipe e desenvolvem habilidades motoras, além de fortalecerem o vínculo familiar.
Qual o papel do governo federal na divulgação das mensagens do Dia das Crianças?
O governo, por meio da Secretaria Especial dos Direitos da Criança e do Adolescente, deve veicular mensagens em TV aberta, rádio e internet, em linguagem acessível, conforme determina o ECA. Em 2025, a campanha "Palavras que abraçam" atingiu 5,3 milhões de visualizações em plataformas digitais, reforçando a importância da data para a população.
Comentários
Carolinne Reis
outubro 12, 2025Você acha que o Dia das Crianças nasce do puro altruísmo? Claro, porque nada melhor que transformar a infância em mais uma estratégia de consumo nacional!!! A história até mostra a politicagem por trás do decreto, então não se engane com o sentimentalismo barato.
Workshop Factor
outubro 13, 2025O Decreto nº 4.867 de 1924, ao ser sancionado, representou mais do que apenas a institucionalização de uma data comemorativa; foi um instrumento de consolidação do projeto nacionalista da Primeira República. A iniciativa de Galdino do Valle Filho refletiu o debate emergente sobre a proteção da infância, ainda incipiente na agenda legislativa. Contudo, a escolha do dia 12 de outubro não foi aleatória, mas uma tentativa deliberada de alinhar a celebração ao simbolismo religioso da padroeira do país. Quando Getúlio Vargas propôs a mudança para 25 de março, encontrou resistência popular, evidenciando a força da tradição popular frente às decisões políticas. Na década de 1960, a exploração comercial da data ganhou novo fôlego, impulsionada pela expansão da televisão e pelos jingles que invadiam as casas. As campanhas publicitárias, como a “Semana do Bebê Robusto”, criaram um vínculo inseparável entre brinquedos e o feriado, aumentando as vendas em mais de 35 %. Os números divulgados pela ABRINQ apontam que o setor de brinquedos movimenta aproximadamente R$ 12,4 bilhões por ano, um reflexo direto da importância econômica do evento. O ECA, promulgado em 1990, trouxe avanços legislativos, mas ainda deixa lacunas na proteção efetiva das crianças, como demonstram os 150 mil casos de exploração infantil registrados em 2022. As políticas públicas, apesar de boas intenções, ainda falham ao garantir o acesso universal à educação, saúde e lazer. As iniciativas recentes, como a campanha “Palavras que abraçam”, são passos positivos, porém insuficientes diante da magnitude do problema. O aumento da taxa de trabalho infantil, ainda que em queda, ainda atinge quase 10 % da população infantil, mostrando que há muito a ser feito. A digitalização das atividades lúdicas, proposta por especialistas, pode representar um futuro mais inclusivo, mas também traz riscos de exclusão digital. Em suma, o Dia das Crianças funciona como um espelho que reflete tanto o potencial comercial quanto as fragilidades das políticas de proteção à infância. Cada promoção, cada anúncio, cada discurso institucional revela camadas de interesses conflituosos que precisam ser desnudados. Portanto, celebrar a data exige consciência crítica, não apenas consumo desenfreado, mas engajamento ativo na promoção dos direitos garantidos pelo ECA.
Escreva um comentário